O cara

(Por: Ronald Augusto no Poesia-pau) "Este fragmento deve começar transcrevendo parte de uma crônica de Machado de Assis publicada no primeiro número da revista O futuro (1862-1863). A crônica foi descoberta por Mario Alencar, também organizador de A Semana, compilação póstuma enfeixando em três volumes as crônicas que Machado escreveu semanalmente para a “Gazeta de Notícias” (RJ). No texto em causa, Machado de Assis defende um “programa de trabalho”. O escrito, efêmero como o suporte onde fora estampado, representa a contrapelo algo como a “pedra fundamental” da sua trajetória de escritor - Machado de Assis contava 23 anos. O cronista que inaugura a sua coluna tira a pena do fundo da gaveta e passa a ministrar-lhe alguns conselhos que, caso aceite, lhe facultarão uma vida “honrada e feliz”. Vejamos alguns trechos: Não te envolvas em polêmicas de nenhum gênero, nem políticas, nem literárias, nem quaisquer outras; de outro modo verás que passas de honrada a desonesta, de modesta a pretenciosa (...) O pugilato das idéias é muito pior que o das ruas; tu és franzina, retrai-te na luta e fecha-te no círculo dos teus deveres, quando couber a tua vez de escrever crônicas. Sê entusiasta para o gênio, cordial para o talento, desdenhosa para a nulidade, justiceira sempre, tudo isso com aquelas meias tintas, tão necessárias aos melhores efeitos da pintura. Comenta os fatos com reserva, louva ou censura, como te ditar a consciência, sem cair na exageração dos extremos. E assim viverás honrada e feliz. Na observância deste verdadeiro projeto estético, a pena machadiana desborda dos limites da crônica semanal a que se destinava, e vai desembocar nessa prosa sibilina e irônica que marca parte significativa de sua obra. Machado de Assis, na assim chamada trilogia metalingüística, composta dos romances Dom Camurro, Memória Póstumas e Quincas Borba, leva a cabo este ideário estético em perspectiva, com que àquela altura inaugurava sua tarefa de cronista". (Imagem de Machado de Assis)

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