Seedorf e Ellen Oléria


Por Cidinha da Silva

A rede de televisão avisa sobre a dificuldade de conseguir entrevistas com Seedorf, em razão de seus hábitos europeus como jogador, desacostumado ao lugar de celebridade e também pela assessoria de imprensa que ainda não é local. Dias depois apresenta uma entrevista exclusiva do Príncipe do Suriname. As coisas são difíceis, mas a emissora consegue, é o recado.

Não assistimos nada diferente da elegância principesca habitual. Seedorf fala em bom português sobre o choque que a malandragem do futebol brasileiro lhe causa, aquela que procura enganar o juiz, e sentencia a negatividade do exemplo para as crianças. A crônica esportiva comenta o quanto a declaração do maestro do Botafogo é coerente com o profissional exemplar e admirável Seedorf, para quem, quando o gol é de mão, não tem tapetão, nem debate de validação em mesa especializada. É algo anti-desportivo e anti-ético, abominável, simplesmente!

Enquanto isso, no outro canal, Ellen Oléria promove mudança na letra de Paulo César Pinheiro. Versara o poeta que o negro entoou um canto de revolta pelos ares, no quilombo de Palmares. Na voz da cantora, onde tudo é altivez e arte (e política), é a negra quem entoa o canto de guerra. Mais uma nota delicada do seu discurso atlântico.

Maria Christina, parceira daquela tarde, é fera, canta bonito, mas, segundo Brown, Oléria respirou e segurou a voz para deixar a outra cantar, numa demonstração de profunda generosidade, porque A voz é também aquela que silencia. Por isso (além do canto magistral), Oléria venceu mais uma etapa do concurso.

E quando nossa cantora vencer a etapa final, não nos lembraremos de Ellen Oléria como portadora de história lacrimosa, como a que triunfou sobre uma saga inacreditável de dificuldades. Não! Ellen vem de outro lugar, afirma outro lugar. Ela ficará em nossa memória pelo refinamento de idéias e atitudes, pela força oceânica do canto, pelo talento, preparo técnico, ousadia e propriedade para dar roupa nova às canções. Ela nos marcará pela alegria de carregar em si, como também o faz Seedorf, o perfume mais sedutor produzido em nosso jardim.

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